As histórias amorosas podem ser muitas, variadas, divertidas, chorosas e, inclusive, vazias. Vazias, o que não quer dizer, isentas de conteúdo, pois podem se mostrar repletas de sentidos. O que quero dizer com vazias, não soa semelhante a ausência de sentido, refiro-me aos relacionamentos em que seus componentes compartilham ou apenas uma das partes vivencia a indiferença. Demonstram-se relações esvaziadas, ao mesmo tempo em que apresentam em sua estrutura restrições quanto aos modos de viver de seus componentes, por exemplo, restrições que se apresentam no despertar/cultivar de baixa autoestima, nos retiram da sociabilidade com os demais, cultivando apatia e/ou medo de nos encontrarmos sozinhos (as) etc. Na literatura e na ficção (cinema), a preocupação com a noção de um íntimo data mais ou menos do Iluminismo. Contudo com o Romantismo há presença e cultivo de idealizações e conjugando-as a noção de íntimo, tal como o íntimo vem se aperfeiçoando ao longo da história da humanidade ocidental, chegamos a noção de um eu. Eu esse decorrente quase, tautologicamente, de estruturas internas que nos instalam no mundo, ao mesmo tempo, em que nos segregam dos demais. O eu, por exemplo, diante de esforços para transformar-se em nós (onde não estaríamos mais sozinhos), não exemplifica uma inclusão, mas, aparentemente, segrega-nos a procura e anseio pelo compartilhar de opiniões e manias equivalentes, fazendo-nos acreditar que necessitamos apenas de encontrar a (as) alma(as) gêmeas, espelhos para nossa história. No contemporâneo, todos os esforços do eu, talvez, residem na satisfação de almejar o reconforto de saber o que esperar do outro (a), o que pode agradá-lo (a) e, assim mais facilmente, alcançar uma sentença do tipo: “se reconquistaram diariamente e foram felizes, até se possível, para sempre”. Afetivamente nos sentimos sensibilizados (as) (atraídos, encantados, curiosos e, também, resistentes, temerosos, seduzidos) por nós mesmos (as), e por outros/outras. Acontece que, cada vez mais, em meio a constatação e exposição que são muitas as nossas possibilidades de nos sentirmos queridos (as) e amados (as), a sensação mais corriqueira é a de abandono, solidão, confusão de pensamentos e quase que instantaneamente, de emoções e de ações. Pois bem, orientar-se psicologicamente em meio ao caos de opções não é apenas escolher a sentença correta ou o par correto, e sim, melhor adaptar-se a partir do reconhecer de que somos/estamos e precisamos construir nosso espaço, nossa identidade, nossa história, saber do que gostamos, do que somos avessos, e, principalmente, naquilo que procuramos em um relacionamento afetivo, o que estamos dispostos a oferecer? Sem cobranças ou frustrações, sem mágicas, ou esforços para construção de algo que não somos e não queremos. Não é a procura de um par para ser meu par, porque já começam aí as mudanças, não é meu, não é posse, não é propriedade, na sequência, não é par ou pares, não a medida intermediária, não há soma de pares iguais equilibradas exatamente com mesma composição. O que há são ímpares, que em meio as diferenças admitem que não são possíveis medianas precisas. O que se mostram são encontros e permanências, nas quais os envolvidos fazem-se presentes nas suas versões inteiras. Unidos constroem (e chamo atenção ao tempo verbal no presente, pois é disto que são usufruídas e alimentadas as escolhas para permanecer juntos) outra dimensão de relacionamentos afetivos cujo sentido apoia-se, não porque um entrou com 50% e o outro (a) com outros 50%. Mas porque o resultado não se resume ao contabilizar do que ofereci e do que recebi. A média é imperfeitamente interessante, disponível, compreensiva, acolhedora, construtiva, alimentada, gerada, aurora de humanos melhores, que não necessariamente faz nascer filhos (as) desta união, e sim, faz nascer princípios e constituintes das melhores versões dos humanos que somos, presentificados e presenteados uns aos outros com o mistério que envolve valer a pena escolher estar junto. Nessa dinâmica, não obvia, somos/estamos ímpares.
Comments